18 de junho de 2013

Caridade versus solidariedade

Luís Farinha


Todos os dias colhemos exemplos de que entre caridade e solidariedade há uma enorme diferença. Pena é que a maioria de nós não se aperceba das diferenças que distinguem uma da outra.

A caridade serve, sobretudo, para calar a consciência de quem dá, mas avilta quem a recebe. Pelo contrário, ser solidário é viver de braços abertos para receber os aflitos. É como estender a mão a quem dela precisa na hora da desgraça. É sofrer com a dor dos seus irmãos e alegrar-se com a sua felicidade. Solidariedade é, para quem a oferece, um sentimento que enobrece e um bálsamo, para quem a recebe.

Por isso eu digo que, parecendo uma sinonímia, há uma diferença abismal que impõe reflexão.

No decorrer da minha já longa vida, senti algumas vezes a indiferença de alguns amigos e conhecidos em certos momentos menos bons que experimentei. Porém, não esquecerei jamais os que me aquietaram nos momentos de ansiedade e rejubilaram mais adiante com a minha felicidade.

Neste nosso Portugal que se afunda no abismo da desesperança, muitos há que atingiram já o patamar mais raso. Famílias inteiras sofrem hoje na carne os efeitos da desordem que lhes caiu no colo. O desânimo está instalado e, de acordo com os especialistas, não há grandes hipóteses de os portugueses da vulgarmente designada classe média voltarem a gozar a euforia económica que marcou o quotidiano das últimas duas décadas. Foi um período nascido de uma sucessão de erros cometidos ao longo de anos por governantes mal amanhados que confundiram a árvore com a floresta. Que se deixaram turvar com as patacas aparentemente inesgotáveis vindas da Europa, levando a que, por arrasto, os cidadãos acabassem por medir o seu dia-a-dia pelo mesmo diapasão.

O país está em frangalhos graças às acções destemperadas de um grupo de novos arquitectos políticos cujas teorias económicas não ponho em causa, embora reconheça que padecem duma enfermidade grave: são falhos de dimensão humana que lhes facilite a aplicação prática da sabedoria adquirida nos compêndios universitários. Resulta daí que a notória falta de experiência profissional (que as suas falhas denunciam) somente seja ultrapassada pela arrogância do poder discricionário que ostentam com ufania.

Voltemos porém ao parágrafo inicial…

Face à derrocada estrondosa da economia em Portugal e à incapacidade demonstrada pelos actuais governantes no sentido de encontrarem formas menos contundentes de a enfrentar, eis que – para surpresa dos mais cépticos – têm-se multiplicado os actos e acções de solidariedade em benefício dos que vêm sendo mais atingidos pelo desabamento. Homens e mulheres, jovens e idosos cônscios do seu lugar no mundo têm surpreendido tudo e todos com a sua abnegação. Acorrem com a sua ajuda – agrupados ou individualmente – minimizando com o seu humanismo os efeitos da sangria obstinada levada a cabo sobre os que menos têm.

Nestas horas de profunda adversidade tem havido inúmeros gestos de solidariedade, sendo inumeráveis os que têm sentido o apelo voluntário de dividir o pouco de que dispõem com aqueles que já nada possuem. São actos abnegados de amplo significado, credores por isso do mais profundo respeito. Marca indelével da chama que habita o coração dos portugueses não será vã esta demonstração de filantropia, estou certo. Em meio à tragédia que nos assola, tenho visto exemplos sem conta de caridade e de solidariedade. Sendo que a primeira provém normalmente de instituições que encaram o auxílio dispensado como o exercício espectável da sua natureza, a segunda destaca-se porque emana de pessoas singulares ou agrupadas para o efeito, gente que nada ou pouco tendo de seu não nega mesmo assim a sua solidariedade aos que têm ainda menos e que sofrem muito mais.

É uma lição com que a vida, por desgraça nossa, nos tem vindo a confrontar ultimamente.    

Sem comentários:

Enviar um comentário