15 de junho de 2013

A selva à minha porta…

Luís Farinha

Os últimos tempos têm vindo a ser marcados por uma sucessão de acontecimentos, quaisquer deles capaz de adulterar a tranquilidade e a paz de espírito que o cidadão comum precisa para ir empurrando a vida para a frente.

Aliás, chega a ser difícil perceber onde vamos nós buscar reservas de energia depois de diariamente sermos submetidos à avalanche de notícias trazidas pela comunicação social. Notícias a que, obviamente, ainda temos de ir acrescentando os altos e baixos da nossa própria vida pessoal.

A verdade é que nós, os humanos, temos muito mais resistência anímica do que é suposto, à primeira vista. Queixamo-nos, lamentamo-nos, mas (sabe Deus como...) lá vamos andando em frente, através do mar revolto da vida. À espera não sei do quê.

É certo que, às vezes, alguns de nós, lá nos deixamos envolver mais do que a conta nos problemas que nos rodeiam e então perdemos de todo o controlo de nós mesmos. Mas, forma geral, passada a onda alterosa que nos submergiu durante algum tempo, aí estamos de novo, prontos a enfrentar os problemas que, afinal, já fazem parte deste mundo louco em que nos foi dado viver. Que mais nos resta, afinal?

Misturados com os próprios problemas pessoais, os últimos tempos têm-nos trazido, por acréscimo, uma série de conceitos que chegam e sobram para ensombrar os amanhãs que estão para vir. Um grupo de políticos de recente geração, impantes de soberana sabença, tem-nos vindo a impor um estilo de vida baseado na teoria de que os pobres têm de ficar cada vez mais pobres para que os ricos sejam cada vez mais ricos. A urgência da implantação de tal filosofia tem marcado o quotidiano dos portugueses a um ponto que toca já a raia da loucura. Sinal insofismável desse tresvario é a sucessão de notícias que diariamente dão conta da imparável precipitação de ocorrências alucinadas que vão por aí. Suicídios, homicídios aloucados, assaltos violentos visando os mais idosos, conflitos de vária ordem, crianças maltratadas, vulgarização dos crimes de colarinho branco e outras, muitas outras ocorrências inexplicáveis que apontam o dedo acusador à transformação brutal que vai sendo imposta aos cidadãos.       

O desemprego imparável, as promessas de tempos piores que estão para vir, a arrogância dos poderosos, a ausência de perspectivas, a fome, o caminho para o vazio, o desaparecimento das pequenas coisas que permitem cumprir o sonho. Sim, o sonho, porque sonhar é o que resta aos que pouco mais têm.   

Por falar em sonhos, fosse lá pelo que fosse, talvez porque a vida real se me vá tornando um fardo difícil de levar, a noite passada tive um sonho bonito que, durante o tempo que durou, me restituiu a paz de espírito. Foi um sonho tão bonito que, quando despertei, grande foi a minha frustração ao verificar que tudo não passara afinal da utopia trazida pelos anseios que se agitam nos recônditos do meu subconsciente.

Sonhei que vivia num mundo onde não havia guerras. Num mundo em que não existiam crianças com fome e crescidas no medo, submetidas à bestialidade. Sonhei que todos os homens eram iguais e que deixara de haver a impudicícia a separá-los. Sonhei, imaginem, que a palavra ‘poder’ fora erradicada e que, em seu lugar, os governos eram agora constituídos por homens sábios, de boa fé, de carácter.      

Acordei a sorrir, transbordante de felicidade!

Aos poucos, porém, enquanto ia tomando consciência de que tudo fora um sonho e de que o mundo real continuava a ser aquele em que eu sempre vivera, senti a decepção submergir-me, senti a raiva crescer e a náusea a aumentar.

Quis correr de volta ao meu sonho bonito, mas não encontrei o caminho para lá chegar.

Então, relutante, levantei-me, vesti-me e regressei à selva que me esperava lá fora.

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