27 de setembro de 2011

Mudar de vida

Luís Farinha

"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas..."
(Guerra Junqueiro, escrito em 1886)

Longe vão os tempos em que os portugueses usavam uma expressão, contundente quanto podia ser atendendo à acção pertinaz do aparelho repressivo do estado, quando pretendiam pôr em cheque a interioridade salazarista que marginalizava o país no contexto duma Europa virada para o futuro: "Portugal é um país adiado", dizia-se, então.

Agora, passadas que estão mis de três décadas sobre a revolução dos cravos, há muitos que se interrogam: “de país adiado, Portugal não terá já passado ao estatuto de país sem futuro"? Na verdade, o que terá mudado de fundamental na vida dos portugueses, em consequência do 25 de Abril?
Mudado para melhor, bem entendido...

Paremos para pensar…

Numa espécie de viagem rápida ao passado, há quem se lembre ainda dos jovens que estudavam (e mesmo dos que não queriam saber dos estudos para nada) que sempre encontravam algo para fazer: um trabalho em qualquer parte, um emprego ou um ofício sempre à espera. E hoje? Que futuro espera os jovens que, completamente desmotivados, gastam o tempo e o dinheiro (que os pais não têm) a frequentar cursos superiores, raramente os da sua vocação, cujos certificados de habilitações não têm, depois, onde os utilizar? Será que, como nesses tempos, aos jovens de hoje só lhes restará continuar a saga da emigração? É nesse sentido que parecem apontar a situação actual e a debandada que já começou.

Mas não é só nesta área que não se vislumbra a esperada (e mil vezes prometida) melhoria de vida dos portugueses.

Por exemplo: que Saúde pública tínhamos no tempo da "outra senhora", e que Saúde temos agora? Acaso a diferença para melhor dá mesmo para se notar? Olhando à volta, francamente parece que não!

E quanto à Segurança Social? Para o que davam, nesses tempos, as reformas dos “empregados do Estado” depois de uma vida de trabalho? Para nada, diziam os idosos desses tempos. E agora? As reformas de velhice chegam para alguma coisa? Por exemplo, dão para que um idoso médio, que trabalhou uma vida inteira, encare o último quartel da sua existência sem uma profunda apreensão?

E a justiça, como era, como vai? Não vai, ponto final.

Antigamente dizia-se: “a política é para os políticos”. Era essa a expressão usada pelos que se acoitavam à sombra do antigo regime. Era um conselho muito usado pelos lados da António Maria Cardoso, quando alguém se aventurava a ter opinião própria. Hoje, porém, continua actual o conceito mais que provado que o que está a dar é ser ex-ministro de qualquer coisa. E os seguidores deste princípio são mais que muitos, como toda a gente vê.

Conclui-se daqui que Portugal pode não ser já "um país adiado", porque, pensarão muitos, passou a ser um "país sem futuro".

Hoje já ninguém tem dúvidas: esta tem sido uma terra abençoada para os espertalhões, para os corruptos e para os que se estão nas tintas para aquilo que noutros tempos era tradição dos portugueses... a vergonha. Tome-se como ilustrativa a multiplicação de escândalos ocorridos nos últimos anos.

Se alguma dúvida restar passemos os olhos pela comunicação social.

Porém, o que já toca as raias do inacreditável é que, sendo a corrupção e os crimes de ‘colarinho branco’ dois dos males maiores deste país, parece que os portugueses estão dispostos a aceitar este estado de coisas como um destino inevitável, como uma condenação atávica da raça lusa.

Há um aforismo popular que diz... "O que não tem remédio... remediado está!" Pois é. É dessa massa que os portugueses são feitos, e os espertalhões sabem isso muito bem. É com a nossa vocação para o ‘deixa andar’ que eles contam. Por isso estão à vontade!

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