22 de fevereiro de 2012

Esta noite eu sonhei...

É verdade que a realidade suja de que hoje é construído o quotidiano mundial, a miúdo nos ensombra o sono com noites mal dormidas, permitindo-nos ir tecendo conjecturas que contribuem para o desassossego que alimenta a nossa vida.

São as notícias apavorantes que a imprensa nos traz diariamente e que digerimos com imensa dificuldade. A crescente constatação da inaptidão demonstrada pela excelsa classe política para resolver os graves problemas que enfermam a Nação conduzindo-nos para um futuro cada vez mais inseguro. A crise económica portuguesa que há muito deixou de ser uma mera figura de retórica para se tornar uma realidade que todos sentimos dolorosamente nos bolsos. O aumento progressivo da criminalidade e da insegurança ante a postura da avestruz adoptada, neste e noutros casos, pelos que podem (e deviam) adiantar medidas que as minorasse. A denúncia de incontáveis casos provados de corrupção que, pela contumácia do crime, já nos habituaram a colocar sempre sob forte reserva as palavras e atitudes impantes duma chusma de senhores enfatuados que em bicos de pés nos querem à força convencer de que, sem a sua intervenção, Portugal será sempre um país sem futuro. A desfaçatez com que nos injectam doses maciças de escandaleiras mirabolantes na grande área do futebol, só para que nos passe despercebido o que vai acontecendo nos campos da política e da economia, cada dia mais periclitantes. É tudo isto que nos deixa a imagem dum país em processo de desmoronamento.

Enquanto isso, ocorre-nos nas noites de vigília, que na morna quietude dos gabinetes do poder se vai engendrando o esbanjamento de fortunas imensas na construção de novos campos da bola ao mesmo tempo que se vão forjando novas formas de esmifrar mais e mais a bolsa já bastante magra dos cidadãos, quer através de novas taxas e impostos, quer fazendo vista grossa ao sempre crescente aumento do custo de vida de quem já pouco ou nada tem para gastar.

Lá mais para o fim do meu sono desta noite deu-me ainda para evocar os fumos dos conflitos sangrentos cujos ecos vindos de longe chegam até nós fazendo com que nos sintamos impotentes face à matança desumana e desnecessária de tanta gente inocente por esse mundo fora e do crescente receio de que, um dia lá mais para diante, tal cenário de tragédia se propague a este nosso amado torrão nascido há novecentos anos na ponta da Europa.

Comecei por falar de sonhos e é a parte bonita do meu sonho desta noite que vos quero contar.

Sonhei, imaginem, que vivia num país, o meu, onde já não havia crianças e velhos com fome. Dei por mim a viver numa nação, a nossa, de gente honrada que subia ao poder para cumprir promessas feitas em áreas que antes criticava aos seus antecessores nas cadeiras do Poder. Sonhei que já se podia entrar num qualquer hospital sem receio de por lá morrer, devido ao desleixo ou à incúria de quem, por todos os meios, devia esforçar-se para minorar o sofrimento. Persuadi-me, no meu sonho bonito, de que os jovens já não estudavam em vão e que os idosos até olhavam o último quartel da vida sem receio de serem deixados apodrecer na penúria das suas pensões de miséria.

Cuidei, nesse sonho que me embalou a noite, que Portugal era agora um país independente e soberano que não vendia a honra em troca de um prato de lentilhas.

Mas a meio da noite, quando finalmente acordei, senti-me por instantes feliz até que, aos poucos, fui interiorizando que tudo não passara de um sonho. Na verdade, um sonho bonito mas longínquo que agora, já sem esperança, jamais verei realizado.

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